segunda-feira, agosto 11, 2014

Destas manhãs...

Pintura de Helen Cottle 


Olho distraídamente os ponteiros luminosos. Sete horas!
Levanto-me de um salto acordando o Sting que, ensonado, me olha inquiridor.
Gosto destas manhãs quase outonais. A frescura que entra pelos poros. O cantar dos pássaros acordando o dia. A tonalidade do arvoredo que distingo para lá das janelas.
O aroma das flores ainda adormecidas que sinto embalar-me os sentidos.
Apetece-me escrever.
Não o que me vai na alma mas o que a natureza produz em mim.
Apetece-me os pés na areia fria da praia que percorro tantas vezes.
O cheiro suave da maresia confunde-se com o da terra ainda húmida da orvalhada da noite.
Há um memorando nos meus pensamentos que corre vertiginosamente dentro do meu olhar.
A melodia da manhã faz eco na paisagem onde vultos se destacam nos seus passos apressados.
Um bando de pombas em direcção ao levante segue a rota do seu destino.
Sinto-me no centro do mundo onde nada e tudo acontece. Uma paz invade-me.
Encontro-me comigo neste vaivém quase imaculado de um tempo que derrama no meu corpo todos os momentos sofridos.
Vôo
Em direcção ao mar.


segunda-feira, julho 21, 2014

Serenamente.

Anna Pavlova, photographer

Dia após dia
Serenamente
Embalo-me
nas águas calmas
da minha alma
Mergulho
no espírito da maré
Renasço
na ondulação do vento.

domingo, julho 06, 2014

A memória de ti...

MM e JP


A memória de ti calma e antiga
Habita os meus caminhos solitários
Enquanto o acaso vão me oferece os vários
Rostos da hora inimiga

Nem terror nem lágrimas nem tempo
Me separarão de ti
Que moras para além do vento.



Sophia de Mello Breyner Andresen,

  in “Mar Novo” 
(Assírio & Alvim)



JP 
(17/04/1955-20/04/2014)

sexta-feira, maio 30, 2014

Para além do Horizonte

Diz-me do horizonte que
não estás perdido
na flor que colheste
no olhar que deitaste na
mão que estendeste

Diz-me que a solidão
não é vida para ser vivida
que o medo não é para ser sentido
que a dor não te rebela o coração.

Diz-me que o sol
brilha no teu olhar
que a tua pele sente a sensação
no pulsar das flores em botão.

Diz-me que na tua alma de criança
brilha a lembrança de mil cores
em gargalhadas sentidas  na descoberta de amores
que florescem em marés de esperança.

Diz-me que para além do horizonte
ainda existes 
Diz-me...

 Responderei:
Que não te prometo
o céu
a terra
e a lua

Eu te prometo
o perfume de uma flor
a espuma do mar
num beijo quente
que te quero dar

Eu te prometo
o carinho
a doçura
dos meus olhos
para te olhar.

Eu te prometo
que nada posso prometer
a não ser o meu amor
que, para sempre,
te há-de pertencer.


Ao JP  (17/04/1955-20/04/2014)

                                 (Desligar a música do blogue para ouvir o vídeo)

quarta-feira, abril 09, 2014

Alheia à engrenagem

Ilha do Pico, cortesia de Abílio Henriques



Exponho-me na versão insensata de qualquer episódio.
Misturo as datas dos factos primordiais,
dos ritos de passagem,
do solstício, da lua nova.
Morro e nasço.
Desdobro atitudes,
evocando arautos de estranhas profecias,
alheia à engrenagem
montada por artífices de paradoxos e de teias. 

De Conjugar afectos, 1977