terça-feira, fevereiro 02, 2016

QUERIA

Vincent van Gogh (Sunflowers)


 Queria ser um girassol. 
Rodar ao sabor do sol.
Queria ser o mar 
de altas ondas verdes 
nos braços do firmamento 
o vento abraçar. 
Queria ser toda a ternura do mundo 
e num abraço fraterno 
mil rostos beijar.

domingo, dezembro 20, 2015

NATAL UP-TO-DATE




Em vez da consoada há um baile de máscaras
Na filial do Banco erigiu-se um Presépio
Todos estes pastores são jovens tecnocratas
que usarão dominó já na próxima década

Chega o rei do petróleo a fingir de Rei Mago
Chega o rei do barulho e conserva-se mudo
enquanto se não sabe ao certo o resultado
dos que vêm sondar a reacção do público

Nas palhas do curral ocultam microfones
O lajedo em redor é de pedras da lua
Rainhas de beleza hão-de vir de helicóptero
e é provável até que se apresentem nuas

Eis que surge no céu a estrela prometida
Mas é para apontar mais um supermercado
onde se vende pão já transformado em cinza
para que o ritual seja muito mais rápido

Assim a noite passa. E passa tão depressa
que a meia-noite em vós nem se demora um pouco
Só Jesus no entanto é que não comparece
Só Jesus afinal não quer nada convosco

David Mourão-Ferreira

segunda-feira, dezembro 07, 2015

Graça Pires


Um final de tarde memorável. 
Uma apresentação brilhante de Lídia Borges.
Um livro para ser lido devagar e com o coração.
A simpatia e a serenidade comovida de Autora tornou ainda mais bonito o momento.
"Tarde de afectos e de reencontros. Poesia em carne e osso.", nas palavras de  Virgínia Do Carmo sobre a apresentação, no Porto, de UMA CLARIDADE QUE CEGA, de Graça Pires, na passada sexta-feira, 4 de Dezembro.

Grata a todos

Traço na areia uma linha em movimento 
de onda e rodo sobre mim mesma
quando as marés me bailam nas ancas.
Esta dança é em mim errática sedução.
O interlúdio da seda perfumada
em que me envolvo.
O jogo sensual no chão do peito,
como grito erguido sobre a língua.
Vem, cadência da música!
Suspende o silêncio que escorre
em pausas onduladas como água.
Encena-me em rituais profanos.
Acrescenta-me à partitura 
ou ao gesto ensaiado e cerzido
nas rugas do meu corpo.
Vem e desliza inteira no êxtase da luz!

de Graça Pires, em "Uma claridade que cega”
 a págs. 13


segunda-feira, novembro 30, 2015

CONVITE



Comemorando 25 anos de edição, Graça Pires apresenta, na livraria Unicepe, no Porto, dia 4 de Dezembro, a sua mais recente obra "Uma Claridade que Cega".
Apresentação a cargo de Lídia Borges.
Contamos com a vossa presença.


(clicar na imagem para aumentar, p.f.)

sábado, setembro 26, 2015

Liberdade

Nos meus cadernos da escola
Na minha carteira nas árvores
Sobre a areia e sobre a neve
Escrevo o teu nome

Em todas as páginas lidas
Em todas as páginas em branco
Pedra sangue papel ou cinza
Escrevo o teu nome

Na selva e no deserto
Nos ninhos e nas giestas
Na memória da minha infância
Escrevo o teu nome

Em cada raio da aurora
Sobre o mar e sobre os barcos
Na montanha enlouquecida
Escrevo o teu nome

Na saúde recuperada
No perigo desaparecido
Na esperança sem lembranças
Escrevo o teu nome

E pelo poder de uma palavra
a minha vida recomeça
Eu renasci para conhecer-te
Para dizer o teu nome

Liberdade

 (Liberté) de Paul Éluard
Imagem de Tomasz  Pluciennik

Moisés Rabinovici, jornalista brasileiro nos seus textos sobre o pintor pernambucano Cícero Dias alude a um acto histórico que envolve o poema Liberté de Paul Éluard e que passo a citar:

"Eu Vi Cícero Dias…
por Moisés Rabinovici

(…) Cícero Dias protagonizou uma obra histórica que lhe valeu a medalha azulada estelar da Ordem Nacional do Mérito da França, recebida das mãos do então primeiro-ministro Edouard Balladur, em 1998, na Unesco. A obra foi uma chuva do poema Liberté, de Paul Éluard, disparado por aviões ingleses sobre a Europa ocupada por tropas nazistas, em 1943. “Se os alemães me pegassem, pá!, me matavam” — então ele sorve mais um gole de uísque, empolgado com as lembranças que ainda o deixam orgulhoso. Para começar sua “missão”, ele cortou a primeira e a última palavra-chave escrita na muamba, Liberté. Era um perigo de morte, liberdade. Depois, a salvo, as reescreveria.

O poema ficou guardado dentro de uma mala na prateleira de bagagens vazia de um vagão de trem com refugiados espanhóis e portugueses. Dias sentou-se distante. Se a revistassem, não saberiam a quem pertenceria. Veio a Gestapo. Um soldado lhe pediu o passaporte. Gritou para outro, na frente: “Brasília!” Mas o devolveu. E não revistaram o maleiro. Já na Espanha, um susto: “A polícia quis saber como eu, brasileiro, tinha cruzado a fronteira”. Não havia o que discutir, só lembrar que “o Brasil não está em guerra com a Espanha”. E assim ele chegou a Lisboa, de onde a embaixada britânica despachou o poema direto para o poeta surrealista Roland Penrose, piloto da Royal Air Force, a RAF. Alguns dias depois, caía poesia das nuvens em todo o front europeu. (…)"



Fontes: pesquisa efectuada pela Internet em sites fidedignos.