segunda-feira, setembro 05, 2005

Fidelidade ou… a Força da Amizade…

A confusão de sentimento que é gerada, cada vez que leio as páginas de um jornal ou, muito simplesmente, vejo os noticiários, foi hoje suavizada pelo texto que li de Manuel António Pina in Jornal de Notícias – última página. 
Resolvi partilhar aqui esse texto 


“Para além do arco-íris”

Imagem daqui


A mensagem que Sue Carey fez publicar na Net através do site da BBC pedindo informações acerca do paradeiro de Dorothy Borne Leavitt, de Kenner, no Louisiana, não dá muitos esclarecimentos. Diz apenas que Dorothy tem 93 anos e que, quando o furacão se abateu sobre a região, destruindo tudo à sua passagem, ela se recusou a partir, pois não quis abandonar o seu cão. Sue está muito inquieta com a sorte de Dorothy e pede a quem saiba dele que lhe dê notícias. Nas escassas três linhas da mensagem, Sue escreve duas vezes "por favor" e, talvez por se encontrar muito perturbada, dá um erro de ortografia na palavra "choose" quando diz que Dorothy "choose not to leave" ("escolheu não partir").

O cão de Dorothy teria provavelmente feito o mesmo, teria ficado ao seu lado se tivesse podido fugir e ela não. Mas dos cães, ao contrário dos homens (que usam a expressão "fidelidade canina" em sentido pejorativo), nós esperamos fidelidade. Por isso a decisão de Dorothy nos comove e nos perturba. Que um ser humano como nós tenha, numa situação tão extrema, sido assim fiel, eis o que é capaz de nos reconciliar por um momento connosco mesmos, principalmente quando as notícias que todos os dias nos chegam das cidades devastadas pelo "Katrina" nos dão conta de pilhagens, de assassínios, de violações e de roubos, praticados por seres humanos sobre outros seres humanos, aproveitando-se da sua desorientação e da sua vulnerabilidade (isso, sim, parece-nos próprio de homens).

E lembro-me de outra Dorothy, esta do Kansas, a de "O Feiticeiro de Oz", de Victor Fleming (um filme que é dedicado "aos jovens de coração"), arrastada também por um furacão sem largar dos braços o seu pequeno preto, transportados ambos para um lugar onde não há infelicidade ("Achas que há um lugar assim, Toto? Tem que haver!, / um lugar onde não se vai de barco nem de comboio, / longe, muito longe, para além da lua, para além da chuva, /algures para além do arco-íris").
Até ontem, o apelo de Sue Carey não tinha tido resposta. Mas eu temo mais por nós do que por Dorothy. Talvez ela esteja agora, quem sabe?, "longe da floresta,/ longe do escuro, longe da noite", diante da Cidade Esmeralda onde só alcançam os que têm a coragem do amor. E, surpreendida e feliz, se volte, também ela, para o cão e lhe diga, abraçando-o deslumbradamente " ".

(Manuel António Pina)

46 comentários:

Menina Marota disse...

Num momento em que é, cada vez maior, o individualismo e o egoísmo do ser humano, em que as notícias e os telejornais “vendem” desgraças após desgraças, este texto lido hoje, num momento, em que a minha alma desanima pela falta de humanidade e de respeito que grassa por esse mundo fora (e cá também!) foi uma lufada de esperança e o revigorar de um optimismo que eu, felizmente, carrego em mim, mesmo nos piores momentos da minha vida.
E porque adoro animais e, porque costumo dizer, que o meu fiel Amigo Sting, um pequeno Yorkshire Terrier, era capaz de dar a vida por mim, tal o amor que lhe pressinto e que eu retribuo, este texto que hoje li, para além de me comover, fez renascer em mim, a esperança de que nada ainda está perdido. Que a esperança de um mundo melhor, baseado na Amizade, ainda é possível.
Esteja onde estiver Dorothy e o seu fiel amigo, sei que estão juntos e felizes.

Anónimo disse...

Certamente que sim! A minha cadela, Bunnie (é liiiiiinda!), compreende-me melhor do que qualquer pessoa. Dá-me tudo sem querer nada em troca! Tenho aprendido muito com ela...

Leonor disse...

gostei da lembrança da dorothy do feiticeiro de oz que para mim é uma das historias mais bonitas sobre a amizade e a aceitação do outro.

beijinhos da leonor

Pescador disse...

Fiquei em silêncio.. após ler estas palavras que tu transcreveste...
mas de certa forma fiquei um pouco aliviado...
com um pouco de esperança ..!!
Sabes, ao contrário do que talvez possam pensar, o post que aqui me trouxe, não é um post contra os EUA... é de simples desânimo, descrença em relação à humanidade, a falta de humanidade...
...
e no entanto ... são estes momentos que ainda nos fazem acreditar.. que talvez ....

Bjs doces pa ti menina !!
Pescador

wind disse...

Lindo e emocionante texto. Beijos

JPD disse...

Fizeste muito bem em editar o texto do MAPina. É excelente e realça um fenómeno extrordinário: o regresso à barbarie, o abandono a que estiveram os sinistrados e o desespero perante a fúria dos Elementos. Quanto aos animais, sabemo-lo: são os donos que os abandonam...pelo menos em Portugal é assim!
Bjs

Anónimo disse...

Talvez a força da amizade da qual jamais se pode desassociar a fidelidade. Fez aqui uma linda postagem. Gostei.

António disse...

Foste muito feliz por teres encontrado e lido este texto, e mostraste a tua sensibilidade e bom gosto ao transcrevê-lo.
Jinhos

Quem sabe... disse...

-Estão sim....Menina, texti«o lindo, acho que pela minha cadelita tb seria capaz das maiore loucuras (alias, já fiz bastantes, e continuarei a fazer)...amor incondicional....então pq não lhes retribuir...basta tão pouco...que eles já ficam felizes...mas eu gosto sempre de dar um pouco mais do q o tão pouco :)

Mocho Falante disse...

São estas pequenas/grandes histórias que fazem brilhar alguma luz perante a catastrofe que assistimos...

Amigo de Alex disse...

Talvez Dorothy já esteja algures para lá do arco-iris, mas decerto não fez a viagem sózinha. Acompanhou-a a benção maior que pode agraciar um ser humano: a capacidade de amar.

O Turista disse...

O "Turistar" faz 1 ano...
:)
Há bolo! Aparece...

Conceição Paulino disse...

Tens razão em postar este texto. Boa semana. Bjs e;)

Isabel Filipe disse...

Oi Marota...

Foi bom teres partilhado este texto...
adorei lê-lo....

"fidelidade vs amizade"...

Bjs

Anónimo disse...

aqui fica mais um Abraço Grande, claro!

;-)

Orlando Braga disse...

Conheço histórias (reais) parecidas com a que foi contada - não em situação de desastre natural em que se arrisca a vida pelo companheirismo, mas no simples dia-a-dia da nossa sociedade - o que não deixa também de ser uma atitude nobre: os animais são nossos companheiros de viagem, não podem ser abandonados. Dorothy levou esse companheirismo ao limite da sua coerência...

LUIS MILHANO (Lumife) disse...

Na dificuldade que hoje temos de abarcar tudo quanto a comunicação social nos traz a lume é bom teres transcrito este texto para a esperança no Homem não se perder de todo.
Que bom seria que os meios de comunicação nos trouxessem mais exemplos destes em vez da violência gratuita que nos impingem diàriamente.

Bjs.

Luís Monteiro da Cunha disse...

Quero agradecer a sua visita ao cantinho.

Também li o artigo.
O que dizer, que já não tenha sido dito?

Tantos casos semelhantes, tanto amor desviado, tantas esperanças frustradas...
Apenas posso demonstrar em pensamento, a minha consternação e solidariedade.

Bjinho

Anónimo disse...

O que posso dizer: este texto (todos os textos como este) comoveu-me e sensibilizou-me. O meu muito obrigada por saber que ainda existem (e eu sei que existem) pessoas como tu e como a Dorothy. O ano passado tb regressei ao fim do 4º dia de férias (de tão longe) pq as minhas "pequenas" não comiam. Elas não comiam com as saudades e as minhas férias seriam + importantes que esse sentimento de gratidão e de saudade? Nunca. Quero ver como vai ser este ano...

Anónimo disse...

NÃO SEI COMO DIZER-TE o quanto me sensibilizou o texto relativo a Dorothy. Ainda há pessoas assim, Graças a Deus. Esteja onde estiver , está bem. Oxalá nós pudessemos dizer o mesmo...

Anónimo disse...

Gerir quatro blogs com algum sentido não é fácil, ainda para mais, pôr em marcha o meu romance no nietzsche, não me sobra muito mais tempo para comentar outros blogs. Mas estico-me e tento de alguma maneira visitá-los e comentar. Escrever faz doer...

Beijos

Isabel Magalhães disse...

Não quero falar aqui, novamente, do que este assunto de New Orleans me tem feito sofrer mas não posso deixar de mencionar o sentimento de angústia que me inundou quando vi o salvamento de pessoas com helicópteros, me imaginei em tal situação e sem poder salvar os meus cães, sabendo que em situações tais as pessoas têm - obviamente - prioridade.

Um abraço. :)

Unknown disse...

Muito lindo o teu post, mas fez-me cair as lágrimas, eu também tenho animais e era capaz de tudo por eles. Beijinhos amiga

Pamina disse...

Olá,
Obrigada pela visitinha. Faço minhas as palavras da Isabel Magalhães, acrescentando a "meus cães" "e meus gatos". Deve ser realmente terrível.
Até sábado e um beijinho.

andorinha disse...

Olá,
Um texto muito comovente.
Obrigada também pela visita ao meu ninho.:)
Beijinho e até sábado.

Andy More disse...

Bem, já tens mais de quinze faltas, mais cinco, chumbo-te o ano!

Bj

elisa disse...

Uma lufada de ar fresco este texto que me faz querer esquecer os cinismos, as ironias, os sentimentos negros que esta tragédia despoletou.
Beijinhos

Raquel Vasconcelos disse...

Querida Menina Marota, embora triste.. adorei o texto!
Qd o iniciei tb pensei no feiticeiro de OZ...

O ser humano tem muitas qualidades... infelizmente tb é muito maltratado pelo seu semelhante. E infelizmente tb só vem nos media o mal que sucede.
Pq há pessoas fantásticas!

Beijo Grande

Vagabundo disse...

É assim quando a fidelidade é reciproca.

Português desiludido disse...

Excelente! Obr por teres partilhado conosco!
1 Bj
Pedro

susana disse...

muito bom, muito bom mesmo

virei mais vezes....

Anónimo disse...

Ah, linda, liiiiiiiiindaaaaa, esta
música!
Mais um Beijinho Grande :-)
Até logo...

Conceição Paulino disse...

URGENTE: p.f. passa lá por casa, há uma petição reclamando por assinaturas. Bjs e ;)

Anónimo disse...

Agradeço-te, desde já, por teres partilhado connosco este texto tão fantástico. Faço-o porque é cada vez mais notório a desumanidade que se vive, até em momentos de catástrofe como este; porque vou ficando desmotivada com as atitudes e as acções que observo no dia-a-dia; mas, acima de tudo, agradeço-te porque demonstraste que existem excepções, que a esperança ainda lateja, que a amizade pode ir pra lá da grandiosidade. São estas histórias que conseguem fazer-me continuar a acreditar! Beijos enormes**

Anónimo disse...

Não fora pela transcrição desse texto empolgante, bem como aos inúmeros outros textos de tua autoria - demonstras a nobreza da tua alma sensível, MM. Um beijo irmão.

VdeAlmeida disse...

Um belo texto sim, MM :)
Beijinhos para ti, e...nunca percas a esperança

Raio de Sol disse...

uma lição de amor, para além de tudo...

uma história bela e triste ao mesmo tempo...

Um beijo...

Anónimo disse...

Existem varios casos desses."eles" merecem , são nossos amigos ,nunca nos abandonam.annie hall do outsider

Mitsou disse...

Pode parecer frieza da minha parte mas sempre que acontecem calamidades destas lembro-me dos cães e gatos que ficarão para trás...por isso tanto me emocionou o texto. Obrigada pela divulgação e partilha, Menina. Um beijo muito carinhoso para ti.

Unknown disse...

Querida Menina!
Vim para ver as novidades e saber como estás!
Vim também para trazer-te flores, sorrisos e muitos beijinhos! E o desejo de que o fim de semana que se inicia seja simplesmente maravilhoso!

Anónimo disse...

Um texto belíssimo, excelente selecção. Gostei, mais uma vez.

Anónimo disse...

Felizmente também se ouvem muitas histórias de anónimos que abrem as portas da sua casa a famílias inteiras que não conhecem nem de ouvir falar, o que também exige muita coragem e, a meu ver, fidelidade a si próprio, ie, aos princípios porque se norteia, de generosidade e de ajudar quem precisa. Vi ontem algumas imagens (evito ver notícias porque fico muito impressionada) e reparei nos animais: alguns cães e um cavalo. Os cães tinham um olhar tão triste, tão triste, que para mim era como se fossem pessoas que também tivessem perdido tudo, até a esperança.

Heloisa B.P disse...

OBRIGADA, pela partilha!
deixo meu Abraco de Carinho e, meu muito Obrigada, por Sua VISITA!
Beijinhos.
Heloisa B.P.
*************

Anónimo disse...

Ora aqui está um exemplo em como os sentimentos não se estendem unicamente aos seres humanos. Mas que os animais também nos preenchem os vazios do coração! O texto está muito bom. Parabéns Manuel António Pina, e a ti, MAROTA, que deste-o a conhecer-nos.

Beijos

Wakewinha disse...

Estou arrepiadíssima...

nmc disse...

São por estas pequenas grandes coisas que vale a pena viver.

Estes gestos de amor iluminam a vida de todos nós.

:)