terça-feira, setembro 27, 2005

Apenas a luz da tarde


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Apenas a luz da tarde
que o prado faz rosa e ouro,
só o poente infinito
que me deslumbra estes olhos,
a solidão junto ao mar
e o amor entre os choupos.

Irei à fonte em ruínas,
tingida de um sol histórico,
pela relvosa vereda
de acácias embriagadoras;
lá sonharei uma vida
livre, clara, melodiosa.


Oh bem-estar! Oh ventura!
O verdelhão melancólico
suavizará a elegia
do brando pinhal umbroso;
serão mais fundos os zéfiros,
será mais profundo o sonho...

Beijo triste! Mágoa alegra!
Nada no mundo de todos!
Uma divina esperança
num recordar alegórico!
Apenas a onda e o sol,
a rosa e o vento, só!

Não voltarei mais... Será
uma viagem misteriosa,
levado, com indolência,
de um encantamento a outro,
pelas sendas mais ocultas
que já não têm retorno.


Poema de Juan Ramón Jímenez, 

1881- 1958


sábado, setembro 24, 2005

Bom fim de semana...


Imagem daqui


"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...”

"Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
- Sei que não vou por aí!"


"Excerto: "

Cântico Negro" de José Régio

terça-feira, setembro 20, 2005

Entardecer

Óleo sobre tela de Marcos Milewski


Amanhecem em mim
todos os dias quentes
de um tempo que já vivi.

Em que virgem me fiz mulher,
mãe-menina de mil solidões,
embalada no sonho
que é a vida aos turbilhões.

Amanhecem em ti
gaivotas no olhar,
plenas de liberdade
voando em dias serenos
de marés azuis e corais floridos,
de águas profundas,
longe das multidões.

Entardecem em nós
momentos fulgurantes
em esvoaçares constantes
de ave roçando o azul
do imenso infinito,
onde a eterna melodia
tocará até ao nascer do dia.

E, da janela da vida,
o sol quente, suavemente,
num mar calmo de ilusões

entardeceu.

sábado, setembro 17, 2005

Chain

















Esta é a primeira corrente que apresento neste Blog.
Habitualmente, o Menina Marota I era o Ponto de Encontro para estes momentos, mas devido aos problemas técnicos lá existentes, aqui estou a cumprir o que me foi pedido pelo Romero e Dizzie
Idiossincrasias - as 5 menos:
A falsidade e a hipocrisia nas pessoas
Quem vive de aparências
Que não me olhem nos olhos, quando falam comigo
Não me sentir bem num lugar
Pessoas frias

Idiossincrasias - as 5 mais:
Os meus Filhos
Os meus animais
Respeito
Amizade
Solidariedade
Alegria


5 álbuns (só 5? – vai ser difícil)
Carl Orff - (Carmina Burana )
Tchaikovsky – (Romeo and Juliet)
Joaquín Rodrigo e Paco de Lucía – (Concierto de Aranjuez)
Sarah Brightman – (The andrew lloyd webber collection –Timeless – Live From Las Vegas – Éden)
Pink Floyd - (The Wall)
Spain – (She haunts my dreams)
Cassandra Wilson – (New Moon Doughter)
Vangelis – Portraits – (Mythodea – Odyssey)
Era - (1 e 2)
Lena dÁgua - Ou isto ou aquilo (álbum para as crianças)

(tenho que ficar por aqui…)
5 Canções


Sarah McLachlan - Angel
Jane Birkin e Serge Gainsbourg - Je t'aime, moi non plus
Andrea Bocelli e Dulce Pontes - O Mare e Tu
Sarah Brightman e José Cura - There For Me
Sarah Brightman - En Aranjuez com tu amor
Leonard Cohen – Dance me to the end of Love

(e, fico por aqui… )


5 albuns en lo iPOD (Se bem entendi…o género de música…)
Acima de tudo clássicas, alguma francesa, algumas latinas
E todas as que indiquei acima…

5 mp3 (o que eu coloco nos Blogs…é só onde tenho mp3)

Carmina Burana – Fortuna_Imperatrix
Bette Midler - Wind beneath my wings
Antony & the Johnsons-Hope There's Someone
Jane Birkin e Serge Gainsbourg - Je t'aime, moi non plus
Concerto de Aranjuez - de Joaquin Rodrigo

Whitney Houston - I will always love you
Annie Lennox - A White Shade of Pale
Queen – Love of my life

Yann Thiersen - D'Amélie

(é melhor ficar por aqui…)


A quem passo esta Corrente: (espero que aceitem…)

Amita – Branco e Preto
José Gomes – Chuviscos
Friedrich - A Babushka
Elise - It’s a perfect day
Sulista
Um bom fim de semana para todos

terça-feira, setembro 13, 2005

Dança...

Imagem daqui


"Beija-me nesse quente amasso
a noite é nossa e de ébria ilusão
dança dentro deste abraço
olha-me com toda tua paixão

Nossos corpos voam no espaço
Sem asas, elevas-me do chão
dança, sem lembrar o passo...
Dança! Dança,... só com o coração

Rasgamos mil passos em cascata
Enquanto teu corpo me arrebata
e teus lábios se oferecem.... num arpejo...

Ah, margens del Rio de La Plata!
como fico louco, louco... de desejo
Danço com ela; és tu, porém,... quem beijo... "



Há dias surpreendentes. Hoje ao descobrir este poema, inserido nos comentários, resolvi partilhá-lo. Espero que o apreciem tanto, como eu…

Agradeço ao autor a sua cedência… aqui

sábado, setembro 10, 2005

Bom dia... a todas as Marias...

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Arabela
abria a janela.
Carolina
erguia a cortina.
E Maria
olhava e sorria:

"Bom dia!"
Arabela

foi sempre a mais bela.
Carolina
a mais sábia menina.
E Maria
Apenas sorria:

"Bom dia!"

Pensaremos em cada menina
que vivia naquela janela;
uma que se chamava Arabela,
outra que se chamou Carolina.
Mas a nossa profunda saudade
é Maria, Maria, Maria,
que dizia com voz de amizade:

"Bom dia!"


Poema de Cecília Meireles



Especialmente dedicado a todas as Marias...

segunda-feira, setembro 05, 2005

Fidelidade ou… a Força da Amizade…

A confusão de sentimento que é gerada, cada vez que leio as páginas de um jornal ou, muito simplesmente, vejo os noticiários, foi hoje suavizada pelo texto que li de Manuel António Pina in Jornal de Notícias – última página. 
Resolvi partilhar aqui esse texto 


“Para além do arco-íris”

Imagem daqui


A mensagem que Sue Carey fez publicar na Net através do site da BBC pedindo informações acerca do paradeiro de Dorothy Borne Leavitt, de Kenner, no Louisiana, não dá muitos esclarecimentos. Diz apenas que Dorothy tem 93 anos e que, quando o furacão se abateu sobre a região, destruindo tudo à sua passagem, ela se recusou a partir, pois não quis abandonar o seu cão. Sue está muito inquieta com a sorte de Dorothy e pede a quem saiba dele que lhe dê notícias. Nas escassas três linhas da mensagem, Sue escreve duas vezes "por favor" e, talvez por se encontrar muito perturbada, dá um erro de ortografia na palavra "choose" quando diz que Dorothy "choose not to leave" ("escolheu não partir").

O cão de Dorothy teria provavelmente feito o mesmo, teria ficado ao seu lado se tivesse podido fugir e ela não. Mas dos cães, ao contrário dos homens (que usam a expressão "fidelidade canina" em sentido pejorativo), nós esperamos fidelidade. Por isso a decisão de Dorothy nos comove e nos perturba. Que um ser humano como nós tenha, numa situação tão extrema, sido assim fiel, eis o que é capaz de nos reconciliar por um momento connosco mesmos, principalmente quando as notícias que todos os dias nos chegam das cidades devastadas pelo "Katrina" nos dão conta de pilhagens, de assassínios, de violações e de roubos, praticados por seres humanos sobre outros seres humanos, aproveitando-se da sua desorientação e da sua vulnerabilidade (isso, sim, parece-nos próprio de homens).

E lembro-me de outra Dorothy, esta do Kansas, a de "O Feiticeiro de Oz", de Victor Fleming (um filme que é dedicado "aos jovens de coração"), arrastada também por um furacão sem largar dos braços o seu pequeno preto, transportados ambos para um lugar onde não há infelicidade ("Achas que há um lugar assim, Toto? Tem que haver!, / um lugar onde não se vai de barco nem de comboio, / longe, muito longe, para além da lua, para além da chuva, /algures para além do arco-íris").
Até ontem, o apelo de Sue Carey não tinha tido resposta. Mas eu temo mais por nós do que por Dorothy. Talvez ela esteja agora, quem sabe?, "longe da floresta,/ longe do escuro, longe da noite", diante da Cidade Esmeralda onde só alcançam os que têm a coragem do amor. E, surpreendida e feliz, se volte, também ela, para o cão e lhe diga, abraçando-o deslumbradamente " ".

(Manuel António Pina)

sexta-feira, setembro 02, 2005

Não sei como dizer-te...



Não sei como dizer-te que minha voz te procura
e a atenção começa a florir, quando sucede a noite
esplêndida e vasta.
Não sei o que dizer, quando longamente teus pulsos
se enchem de um brilho precioso
e estremeces como um pensamento chegado. Quando,
iniciado o campo, o centeio imaturo ondula tocado
pelo pressentir de um tempo distante,
e na terra crescida os homens entoam a vindima
— eu não sei como dizer-te que cem ideias,
dentro de mim, te procuram.

Quando as folhas da melancolia arrefecem com astros
ao lado do espaço
e o coração é uma semente inventada
em seu escuro fundo e em seu turbilhão de um dia,
tu arrebatas os caminhos da minha solidão
como se toda a casa ardesse pousada na noite.
— E então não sei o que dizer
junto à taça de pedra do teu tão jovem silêncio.
Quando as crianças acordam nas luas espantadas
que às vezes se despenham no meio do tempo
— não sei como dizer-te que a pureza,
dentro de mim, te procura.

Durante a primavera inteira aprendo
os trevos, a água sobrenatural, o leve e abstracto
correr do espaço —
e penso que vou dizer algo cheio de razão,
mas quando a sombra cai da curva sôfrega
dos meus lábios, sinto que me faltam
um girassol, uma pedra, uma ave — qualquer
coisa extraordinária.
Porque não sei como dizer-te sem milagres
que dentro de mim é o sol, o fruto,
a criança, a água, o deus, o leite, a mãe,
o amor,

que te procuram.


(excerto do poema “Tríptico” de Herberto Hélder
Publicado em A Colher na Boca, 1961)



Imagem Isabel Filipe